RUÍDO E CONTEMPLAÇÃO

A música sempre acompanhou a rotina de Paula Rebellato. Interessada em som e munida de muita curiosidade, desde a adolescência a paulistana se aventurava em colagens no computador e ia aprendendo - à sua maneira, de forma bem autodidata - a tocar instrumentos. E São Paulo sempre foi meio, influenciando e refletindo o que a artista produzia: dos ruídos da cidade até a busca por algo oposto, meditativo.

 
 

Inquieta e sempre produzindo, Paula tem projetos solo, é integrante de duos e bandas - entre eles o Rakta, no momento em hiato, com o qual rodou o mundo por uma década. Além disso, hoje ela está por trás de um estúdio musical e da Porta, um cantinho na zona oeste onde é possível ouvir ótima música experimental.

Em uma conversa com o Inner Circle, a artista falou sobre seu caminho na música, sobre a arte de gerenciar um espaço cultural e também indicou locais underground em São Paulo para conhecer música autoral, de improviso, confortavelmente esquisita.

 

Recém re-inaugurada, a Porta traz uma curadoria de artistas e bandas independentes em sua programação semanal.

Paula, como tem sido seu caminho com a música, de descobrir o que gosta e ir experimentando até os projetos que tem hoje?

Eu comecei a produzir na adolescência, fazendo testes com computador, colagens sonoras. Sempre me interessei por tocar instrumentos, tentar aprender. Meu caminho é autodidata, eu aprendi o que eu faço hoje da minha maneira, e tive algumas bandas até chegar ao Rakta que foi a banda que realmente me colocou nesse caminho da música. 

O Rakta começou em 2011 e a gente era quatro garotas na época, e a partir dali eu fui desbravando vários outros caminhos na música, caindo na música experimental, de improviso, fiz projetos solo, participei de outras bandas. Crio também trilhas, tudo que envolve o som e a música. Foi por meio de turnês extensas que o Rakta fez por muitos lugares no mundo que foi abrindo a rede de contatos no meu círculo musical, tanto desse lugar do underground, de onde eu venho, quanto do experimental, da música de improviso.


São Paulo te inspira de alguma forma na hora de criar?

São Paulo com certeza influenciou bastante na minha música, principalmente no Rakta que é uma música mais agressiva, barulhenta, caótica, de muito expurgo, assim como também nos meus outros projetos, como o Acavernus, projeto solo que acabava entrando em lugares mais obscuros, musicalmente falando. Então a música de ruído com certeza tem a ver com a cidade. Tanto o ruído externo da cidade quanto o nosso ruído interno. 

São Paulo tanto traz à tona a energia mais violenta e caótica, criativamente falando, quanto a busca pelo seu oposto, de algo mais meditativo, que também está expresso nos meus trabalhos. Não acho que tem como dissociar o meio em que você vive do que você produz. Tanto que quando já tive oportunidade de produzir em outros lugares, eu consegui notar a diferença do que se manifestou ali.

 

Quais os projetos que você tem hoje na música?

Meus projetos ativos hoje são a banda Madrugada, meu projeto solo como Paula Rebellato, e minhas colaborações em duos, trios. Eu tenho um duo que faço de vez em quando com um amigo palestino, o Yousef Saif. Ou eu e o Mari Crestani, que é meu sócio no estúdio. Recentemente também comecei um duo que é o Qamar, com o multiinstrumentista Cacá Amaral. O Rakta tá em hiato. E tem trabalhos com trilha sonora que gosto muito de fazer.

Como é ser artista e também gerenciar um espaço cultural?

A Porta nasceu em março de 2022, sou eu mais dois sócios, o Rafael e o Bruno. A gente abriu logo após a pandemia e, desde então, tem sido uma loucura boa. É muito gratificante poder trabalhar com a cultura, com a música independente, estar movimentando a cena. É um desafio, especialmente porque somos independentes, balancear nossa paixão com a parte comercial, de pagar as contas, os artistas, nos pagar. Tem sido uma viagem bastante enriquecedora, muito difícil mas também muito gratificante. 

Agora a gente acabou de se mudar pra um novo endereço, pra uma casa maior, onde conseguimos receber mais pessoas, festas, bandas, com uma estrutura melhor. Tá sendo uma experiência de vida intensa. E como durante o período do Rakta eu fui recebida nos espaços, no começo da Porta foi interessante estar do outro lado, recebendo, acolhendo.

Quais seus lugares favoritos em São Paulo para ouvir música autoral, independente, para conhecer o trabalho de novos artistas? 

Desde que abri a Porta tem sido difícil estar em outros lugares, mas tem dois que eu diria que são muito relevantes pra mim justamente porque também abraçam a música esquisita da cidade - que é o lugar que eu pertenço. Tem o Bolor, dos donos do antigo Hotel Bar. Agora eles estão mais pra região da Santa Cecília com esse novo espaço que começou a abrir a agenda pra fazer shows. E tem o Garagem Beleza, mais pro lado da Pompeia, um lugar bem pequenininho que também abre espaço para esse tipo de som de música experimental. Ambos são independentes e feitos por pessoas realmente apaixonadas por música, por rolê, pela arte e que mantêm a cidade viva, acontecendo.

 
 

“Não acho que tem como dissociar o meio em que você vive do que você produz. Tanto que quando já tive oportunidade de produzir em outros lugares, eu consegui notar a diferença do que se manifestou ali.”

 
 

Além de bar, o Bolor é também um misto de loja de discos e brechó. Aberto de quinta a sábado, o bar traz discotecagens e pequenas apresentações em formato pocket.


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